QUEM PAGA A OTA?
O Governo tem tentado passar a ideia de que o futuro
aeroporto da Ota será um empreendimento essencialmente
privado com uma contribuição do Estado português de apenas
10%. Mas por detrás de um aparente investimento privado
estão custos ocultos que o tornam num investimento
essencialmente público. A maior parte da contribuição do
Estado será feita através de contrapartidas não financeiras
cujo valor ultrapassa em muito os 10% anunciados pelo
Governo. Em troca da construção da Ota por entidades
privadas, o Governo pretende oferecer a desactivação da
Portela, os acessos rodoviários ao aeroporto, um shuttle para
ligar a Ota a Lisboa em 20 minutos, um terminal de TGV, parte
do capital da ANA (empresa pública gestora dos aeroportos),
fundos comunitários que poderiam ser aplicados noutros
projectos, o monopólio sobre todos os aeroportos de Portugal
continental e a concessão da Ota por dezenas de anos.A chave
do negócio do aeroporto da Ota está no destino que o Governo
pretende dar à ANA e ao aeroporto da Portela. O Governo
pretende usar a ANA para financiar o aeroporto da Ota de
duas formas. Por um lado pretende vendê-la abaixo do preço
de mercado aos privados que estiverem dispostos a investir na
Ota. Por outro pretende incluir no mesmo pacote de
privatização todos os aeroportos de Portugal continental. O
Estado atribuirá assim dois subsídios aos privados que vão
investir no aeroporto da Ota, um igual à diferença entre o valor
real da ANA e o valor pelo qual será vendida e outro igual às
receitas em excesso que o futuro concessionário conseguirá
cobrar por explorar três aeroportos em regime de monopólio.
Estes subsídios serão pagos por todos os portugueses, que
verão parte do património público ser transferido para os
privados, e pelos utentes dos aeroportos, que terão que pagar
taxas aeroportuárias mais elevadas.Para garantir o
monopólio do futuro concessionário, o Governo terá que
desactivar o aeroporto da Portela em 2017. Ora, em 2017 a
Portela será um aeroporto rentável, com capacidade para 16
milhões de passageiros, no centro de Lisboa e com ligação ao
metro. Pela sua localização e pela sua capacidade, a Portela
terá um valor económico da mesma ordem de grandeza que o
valor do futuro aeroporto da Ota. Esse valor é património
público. Será mais um valor a pagar por todos os portugueses
para que a Ota possa ser construída, mas que não será
recebido por ninguém. Será pura e simplesmente destruído.
Restarão os terrenos, cujo estatuto legal é incerto e que terão
que ser descontaminados de toda a poluição acumulada. O dr.
António Costa quer transformá--los num "pulmão verde"
muitíssimo caro e o ex-ministro da Economia Augusto Mateus
quer mantê-los de reserva para a eventualidade de a Ota
saturar lá para 2030.
João Miranda
DN 02-06-07